Pode ser num papel de embrulho!

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Hoje, como nos antigos natais, permito-me a um exercício do imaginário. Nenhum trem de lata vai romper as lonjuras do terreiro lá de casa. Nem um piá de calças curtas embalará sonhos no colo da mãe, à espera de um presente. Mas isso não importa. Importa é que eu revisite um passado de lindas e ternas recordações. Um tempo que a lembrança mantém, nutrido pela inocência de criança e por uma saudade que faz bem.

Lembro que minhas irmãs e eu não contínhamos a ansiedade, quando o nosso pai apontava no alto da coxilha, vindo da cidade. Todos nos consumíamos em expectativas, para saber o que nosso pai trazia nos largos bolsos da bombacha. Bastava um punhado de caramelos ou pequenos brinquedos, enrolados por um papel de embrulho. A festa já estava completa. Não precisava ser o Papai Noel. Depois, vários anos mais tarde, todos nós já morando na cidade, víamos o pai transformar-se num Noel ‘de verdade’, nos encontros em família. Tal era o seu desejo de repartir alegrias.

Foram dois tempos, duas épocas distintas, e que, hoje, fazem muita falta. Natal é renovação, renascimento interior, doação, empatia. Assim, o melhor dos presentes não precisa, necessariamente, ser material, ou movido por opulência ou ostentação. Se, simbolicamente, estamos a celebrar o nascimento de Jesus, o Deus Menino, que sejamos à imagem e à semelhança do seu exemplo!

Natal não é uma data. Deve ser todos os dias. E, como presentes, que cada um distribua sorrisos, abraços, afetos, carinhos, respeito, solidariedade, paciência, simpatia, simplicidade, desejos e positivas vibrações. Muitos são os que, além destes gestos e sentimentos, esperam por um prato de comida, porque, além da alma, também o corpo físico precisa de alimentar-se. Abençoados aqueles que, todo o ano, vivem para a doação e para minimizar as dores e carências dos outros.

Que o Natal que está por acontecer no calendário toque nos corações embrutecidos pelo desamor ou golpeados pela ganância e a vantagem a qualquer preço. A humanidade vem se melhorando ao longo dos séculos, apesar de tudo. Mas dia chegará em que, num exercício de auto reforma completa, tomará consciência de que somos todos iguais e irmãos. E enquanto espero por este dia, quero, por ora, só um punhado de caramelos. Pode ser num papel de embrulho!